Powell corajosamente cortou os juros mesmo sem controlar a inflação
Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (Fed), tomou uma decisão arriscada ao reduzir as taxas de juros na quarta-feira, 17 de setembro de 2025, apesar de a inflação ainda não estar sob controle. Essa ação, embora parecesse uma medida rotineira de política monetária, ocorre em meio a um cenário complicado, onde o banco central enfrenta pressões políticas inéditas e a necessidade de equilibrar uma economia que apresenta sinais de desaceleração.
Esta não é a primeira vez que Powell tenta usar cortes na taxa de juros para prevenir uma recessão. Em 2019, sua estratégia foi interrompida pela pandemia da Covid-19 antes que os resultados pudessem ser avaliados. Embora o mercado de trabalho tenha se estabilizado no último ano, a inflação voltou a se mostrar presente, possivelmente influenciada pelas tarifas comerciais impostas na época do ex-presidente Donald Trump.
O desafio para o Fed é duplo: manter sua independência diante de pressões externas e agir numa economia que apresenta crescimento mais enfraquecido. Historicamente, tentativas de manipular as taxas de juros tiveram resultados variados. Na década de 1990, o banco central americano conseguiu promover um “pouso suave”, ampliando a economia sem causar aumento da inflação. Entretanto, episódios em 1967, 1990, 2001 e 2007 mostraram que cortes nos juros nem sempre evitaram recessões.
As previsões atuais do Fed para o crescimento econômico, inflação e emprego permanecem estáveis em relação a junho. Analistas indicam a possibilidade de até três cortes nas taxas de juros ainda em 2025, incluindo o recente. A principal razão para essa expectativa é a desaceleração do crescimento do emprego — que, desde a última reunião, foi revista para um número muito menor de vagas criadas do que o inicialmente reportado, representando um risco significativo para o mercado de trabalho, conforme destacado pelo próprio Powell.
Críticas à postura do Fed e riscos do ajuste
Alguns economistas consideram que Powell deveria ter adotado uma postura mais agressiva na redução dos juros. Jeffrey Cleveland, economista-chefe da gestora Payden & Rygel, afirma que é raro o mercado de trabalho desacelerar sem que a economia entre em recessão, expressando ceticismo sobre a possibilidade de se evitar este cenário. Ele ainda alerta que o Fed pode estar dando mais atenção ao impacto das tarifas na inflação e menos ao seu efeito negativo sobre a geração de empregos, sobretudo em setores industriais com custos mais elevados para insumos importados.
Além disso, há preocupações sobre possíveis interpretações equivocadas do Fed em relação às mudanças estruturais na economia, que podem ser vistas como fraquezas temporárias, quando, na verdade, podem indicar limitações permanentes na capacidade produtiva devido, por exemplo, a políticas restritivas de imigração implementadas no governo Trump.
Ethan Harris, ex-chefe de pesquisa econômica global do Bank of America, alerta para os perigos de cortes excessivos nas taxas de juros. Segundo ele, após anos de inflação alta, consumidores e empresas podem começar a esperar aumentos regulares de preços, dificultando o controle da inflação no longo prazo. Essa preocupação do cidadão comum com a alta de preços foi um fator importante na última eleição americana, destacando a desconexão entre economistas e a percepção pública.
Comportamento do consumidor e cenário futuro
O desempenho do mercado de ações contrasta com a fragilidade do mercado de trabalho e o desaquecimento do setor imobiliário. Embora estes indicadores mostrem fraqueza, os gastos dos consumidores continuam fortes e as empresas têm investido intensamente em tecnologias como inteligência artificial. A dúvida que permanece é se esse consumo será mantido diante da desaceleração na geração de renda ou se outras forças poderão sustentar a economia.
Powell reconheceu que não há caminho sem riscos, especialmente diante da combinação de um mercado de trabalho enfraquecido e inflação persistentemente alta. Apesar de algumas explicações terem parecido confusas, o contexto delicado e a falta de consenso claro refletem as complexidades atuais enfrentadas pelo Fed.
Até o momento, Powell teve sucesso em preservar um certo consenso dentro do banco central, mesmo com divergências internas em relação às perspectivas econômicas e a fortes pressões externas. Nesta última decisão, apenas um dos governadores do Fed, Stephen Miran — que foi conselheiro de Trump e assumiu o cargo recentemente — demonstrou discordância, defendendo um corte mais expressivo e prevendo uma taxa de juros inferior a 3% até o fim do ano.
O Fed agora deverá enfrentar debates intensos e divisões persistentes, independentemente da liderança que estiver no comando. Caso os dados econômicos futuros não apontem para uma redução das divergências, Powell terá que defender a autonomia do banco central repetidas vezes, ajustando as decisões com grande cautela.
A decisão tomada manteve os juros entre 4% e 4,25% ao ano, abrindo espaço para possíveis próximas reduções em outubro e dezembro de 2025.



