Empresário Argentino Marcelo Mindlin Lidera Reconstrução da InterCement

Empresário Argentino Marcelo Mindlin Lidera Reconstrução da InterCement

A reconstrução da InterCement com a entrada de um empresário argentino na liderança

Marcelo Mindlin, proprietário da Pampa Energía, assume papel central na cimenteira após a recuperação judicial do grupo Mover.

Marcelo Mindlin, empresário argentino, desde cedo entendeu a importância de manter liquidez para enfrentar as frequentes instabilidades econômicas de seu país. Ele também segue a filosofia de que as crises representam as melhores oportunidades para investimento. Foi dessa forma que, em 2016, adquiriu as operações da Petrobras na Argentina, transformando seu grupo, a Pampa Energía, na maior empresa privada do setor energético no país vizinho.

Agora, seguindo essa mesma estratégia, Mindlin está prestes a substituir a família Camargo, proprietária da Mover (antiga Camargo Corrêa), como um dos acionistas de maior relevância na InterCement, terceira maior produtora de cimento no Brasil.

À frente de um grupo de investidores internacionais, Mindlin comprou dívidas da InterCement detidas por bancos brasileiros, concentrando a maior parte dos passivos para fortalecer sua posição de negociação com a Mover. Uma assembleia marcada para esta segunda-feira (6) deve confirmar a saída definitiva da família de Sebastião Camargo do setor de cimento, abrindo espaço para que os credores assumam o controle da InterCement.

Este consórcio, que também inclui gestoras como Moneda, Redwood e Contrarian, já reuniu aproximadamente R$ 7,3 bilhões em títulos de dívida da empresa, tornando-se o maior credor da companhia, que possui cerca de R$ 9 bilhões em passivos.

Em entrevista recente ao economista Alfredo Zaiat, Mindlin destacou: “Numa Argentina com tanta volatilidade, a questão financeira é determinante. Quem se endivida e é pego por uma crise acaba fracassando. Porém, se você enfrenta a crise com liquidez, pode aproveitar a oportunidade para crescer, seja investindo ou adquirindo ativos.”

O foco do interesse de Mindlin é a Loma Negra, empresa que detém 45% do mercado argentino de cimento e que apresentou lucro de US$ 19,2 milhões no primeiro semestre deste ano, com receita líquida de US$ 291 milhões. A InterCement controla 54% das ações da Loma Negra, enquanto o restante está em circulação no mercado (“free float”).

Listada na Bolsa de Valores de Nova York, a Loma Negra é considerada o ativo mais valioso da InterCement e chamou a atenção de grandes investidores brasileiros, como Benjamin Steinbruch, proprietário da CSN, que tentou comprar a InterCement até o final do ano passado, antes do pedido de recuperação judicial. Atualmente, na imprensa argentina, Marcelo Mindlin é visto como o novo controlador da Loma Negra.

Para Mindlin, a saída das multinacionais do país representa uma oportunidade: “Todas essas empresas foram adquiridas por empresários locais, algo inédito na Argentina. Vejo um momento em que os empresários argentinos estão liderando e investindo no país.”

Além do valor simbólico de devolver a Loma Negra a controle nacional — a empresa foi criada por Amalia Fortabat em 1926 e comprada pela Camargo Corrêa há 20 anos por US$ 1 bilhão —, Mindlin controla a construtora SACDE, uma das maiores da Argentina, e pode buscar expandir verticalmente seus negócios por meio da cimenteira.

O destino das operações brasileiras da InterCement — que inclui um parque industrial com 10 fábricas e as marcas Cauê, Goiás e Zebu — permanece incerto. Profissionais do setor ainda não têm clareza sobre as intenções de Mindlin para essas unidades.

Um executivo do mercado ouvido pelo InvestNews aponta: “A tendência é que Mindlin fique com a Loma Negra, enquanto os outros credores mantenham ou vendam o restante da operação no Brasil, devido à falta de sinergia com seus negócios. Porém, ainda é cedo para afirmar com certeza.”

Outra questão pendente é qual será a parcela exata que Mindlin terá na nova InterCement. Procurados na última semana, representantes do empresário não se manifestaram, e tanto a InterCement quanto a Mover não fizeram comentários.

O futuro da InterCement

Fundada em 1939 por Sebastião Camargo e Sylvio Brand Corrêa como uma empreiteira, a Camargo Corrêa logo se diversificou para outros setores. O cimento, insumo fundamental para suas obras, ganhou destaque com a criação da Camargo Corrêa Cimentos na década de 1970. Sob o comando da família Camargo, a empresa expandiu suas operações para nove países, contando com dezenas de fábricas e milhares de funcionários, passando a se chamar InterCement.

Contudo, a crise enfrentada pelo grupo da família Camargo após os desdobramentos da Lava Jato tornou suas dívidas insustentáveis. Uma tentativa frustrada de abertura de capital na InterCement agravou ainda mais a situação. Em dezembro, a InterCement e a Mover entraram com pedido de recuperação judicial.

Dentro do plano de recuperação judicial, os credores puderam optar pela conversão de dívidas em ações da empresa, ganhando participação acionária e direito a voto. Aqueles que recusassem essa troca teriam de aceitar prazos longos para pagamento, carência e descontos que, em alguns casos, ultrapassam 60%.

Na prática, isso significa que quem controlar a maior parte dos títulos de dívida terá o controle da InterCement. Com a saída definitiva da Mover do capital da cimenteira, a liderança do negócio caberá exclusivamente ao grupo de credores liderado por Marcelo Mindlin.

Nos últimos meses, esse grupo adquiriu créditos de bancos que não tinham interesse em virar acionistas ou aguardar anos para reaver seus recursos, incluindo os dois principais credores da InterCement: Itaú e Banco do Brasil.

De acordo com levantamento, Mindlin e seus parceiros já controlam aproximadamente R$ 7,3 bilhões em títulos da empresa. Dos R$ 9 bilhões em dívidas, cerca de R$ 4 bilhões estão vinculados à Loma Negra, que pode ser vendida para Mindlin ou algum outro investidor. O restante será convertido em novas dívidas reestruturadas e participações na InterCement.

Em julho, a InterCement anunciou um acordo com seus credores que prevê títulos participativos vinculados à Loma Negra, com direito a dividendos e venda futura, além de novas garantias e a suspensão de litígios. Essa reestruturação proporciona um alívio imediato para a empresa e estabelece a maneira como os credores serão remunerados até 2026, quando deverá ser definido o futuro da empresa argentina.

Além disso, a Mover aceitou vender sua participação de 14,86% na Motiva (antiga CCR) para quitar dívidas com o Bradesco, recebendo R$ 450 milhões em dinheiro e até R$ 50 milhões adicionais em “warrants” — instrumentos que oferecem ganhos extras se a empresa atingir determinado valor de mercado.

Perfil de Marcelo Mindlin

Marcelo Mindlin nasceu em 1964 na cidade de La Carlota, interior de Córdoba, na Argentina. Filho de médicos e de origem judaica, passou parte da adolescência em Israel antes de retornar a Buenos Aires para estudar economia na Universidade de Buenos Aires (UBA). Concluiu ainda um MBA no Centro de Estudios Macroeconómicos de Argentina (CEMA). No ranking de 2024 da revista Forbes, ele figura como a 31ª pessoa mais rica da Argentina, com patrimônio estimado em US$ 900 milhões.

Entre 1991 e 2003, participou como acionista e diretor financeiro da IRSA, um dos maiores grupos imobiliários argentinos, além de atuar em iniciativas regionais, como o Fundo de Valores Inmobiliarios na Venezuela e a Brazil Realty no Brasil.

Em 1989, criou o Grupo Dolphin, que deu origem ao atual Grupo Emes, seu veículo de private equity. A grande virada em sua trajetória ocorreu em 2005, com a fundação da Pampa Energía, hoje o maior grupo privado integrado de energia da Argentina, listado nas bolsas de Buenos Aires e Nova York.

Mindlin consolidou sua reputação adotando um modelo replicado diversas vezes: adquirir ativos depreciados durante momentos de crise e transformá-los em plataformas de expansão. Em 2016, comprou a Petrobras Argentina por US$ 875 milhões em meio a uma recessão e a transformou em um pilar da Pampa Energía. O mesmo ocorreu com a construtora IECSA, pertencente à família Macri, rebaptizada como SACDE, que passou a disputar contratos estratégicos, como para o gasoduto de Vaca Muerta.

Hoje, aplica a mesma estratégia ao setor de cimento, utilizando a fórmula “loan-to-own” — comprar dívida para converter em controle acionário — para assumir o controle da InterCement, dona da Loma Negra na Argentina, com atuação também no Brasil.

Além dos segmentos de energia e construção, Mindlin é co-controlador da seguradora Orígenes e fundador e presidente do Museu do Holocausto em Buenos Aires. Tem ainda um papel ativo em ações filantrópicas por meio da Fundação Pampa, que atua na área de educação, e da ONG Tzedaká.

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