Excedente no mercado de petróleo em 2026 pode trazer custos elevados
O mercado petrolífero está se encaminhando para um grande excesso de oferta no início de 2026, situação que pode ser descrita como “cartunesca”, segundo o Macquarie Group, instituição financeira com forte atuação em commodities. A solução para esse excesso será o armazenamento de milhões de barris de petróleo bruto em instalações especiais, uma prática comum, porém com um fator agravante: as atuais taxas de juros são significativamente mais altas do que nas situações semelhantes ocorridas nas últimas duas décadas, tornando o financiamento desse excedente bastante caro. Esse problema, pouco discutido atualmente em Wall Street, pode intensificar o pessimismo no setor petrolífero.
Após o recente acordo da Opep+ para ampliar a produção, é importante entender que, em caso de grande excedente, a dinâmica da curva de preços do petróleo muda para possibilitar que o armazenamento se torne financeiramente vantajoso. Quando os estoques aumentam, essa curva se inverte, fazendo com que os preços no mercado à vista fiquem inferiores aos preços futuros, condição conhecida como contango. Nesta situação, investidores compram petróleo no mercado spot a preços mais baixos, armazenam-no, e lucram ao vendê-lo futuramente a valores superiores no mercado de derivativos.
Operações baseadas no contango são conhecidas desde o início da indústria de commodities. Nas últimas duas décadas, houve episódios relevantes em 2020, durante a disputa de preços entre Arábia Saudita e Rússia e a pandemia; entre 2014 e 2017, quando Riad iniciou uma guerra de preços contra o petróleo de xisto dos EUA; e entre 2008 e 2010, logo após a crise financeira mundial.
A amplitude do contango geralmente depende do tamanho do excedente, dos custos para armazenar o petróleo e das despesas de financiamento. À medida que o volume excedente aumenta, o valor do armazenamento também sobe, pois a indústria precisa recorrer a instalações mais caras, saindo das grandes cavernas e tanques principais para tanques menores próximos aos centros de refino e, por fim, para navios-tanque que funcionam como depósitos flutuantes, que têm o custo mais elevado e são logisticamente complexos.
As despesas financeiras entram em jogo de acordo com o custo do barril de petróleo e as taxas de juros em vigor. Atualmente, essas taxas estão muito acima das registradas nas situações anteriores de excesso de oferta, o que representa um desafio extra. Para exemplificar, durante eventos passados as taxas americanas de referência estavam em torno de 2,5% em 2009, 2% em 2015 e menos de 1% em 2020, já hoje ultrapassam 4%. Mesmo que haja cortes até o começo de 2026, o custo financeiro continuará superior ao das ocasiões anteriores, especialmente porque os traders enfrentam custos adicionais para se financiar acima desses índices.
Com taxas de juros elevadas, a curva de preços do petróleo terá que apresentar um contango mais acentuado para equilibrar os custos adicionais do financiamento. Informações de operadores do mercado indicam que, se as taxas se mantiverem, elas podem acrescentar cerca de 10 centavos de dólar por barril mensalmente ao custo do armazenamento, resultando em um spread temporal anual superior a US$ 1 por barril em relação ao cenário tradicional. Nos últimos 20 anos, mercados em contango atingiram níveis mínimos de US$ 10 por barril de spread anual.
Por enquanto, a China tem ajudado a absorver esse excesso, estocando petróleo por motivos estratégicos e não comerciais, o que mantém a curva de preços na forma tradicional, com preços à vista mais elevados que os futuros, chamada de backwardation. Contudo, essa situação está mudando, e a tendência é para o surgimento do contango. Atualmente, a diferença entre preços à vista e futuros para um ano é de cerca de 65 centavos por barril em favor da backwardation.
O cenário se torna mais crítico com o aumento dos carregamentos de petróleo em trânsito rumo aos principais centros de refino globais. Em setembro, o volume de óleo transportado por petroleiros atingiu níveis que não eram vistos há uma década, à exceção de um breve episódio em 2020, quando Arábia Saudita e Rússia lançaram um intenso aumento de oferta. Logo esses petroleiros estarão descarregando suas cargas, e em seguida a demanda por armazenamento comercial deve crescer consideravelmente. Para que isso aconteça, a curva de preço precisará inverter de forma mais marcante para tornar economicamente viável o armazenamento, compensando também os custos financeiros elevados.
O contango está se aproximando, e a grande questão é sua dimensão e se será conduzido por preços à vista mais baixos ou preços futuros inflacionados. Autor do artigo aposta que a resistência do petróleo em US$ 60 por barril fica bastante vulnerável frente ao aumento significativo da oferta que se anuncia.
Esta análise expressa as opiniões pessoais do autor e não necessariamente reflete a visão da Bloomberg LP ou de seus colaboradores.
Javier Blas, colunista da Bloomberg Opinion, especializa-se em energia e commodities, além de ser coautor do livro “The World for Sale: Money, Power, and the Traders Who Barter the Earth’s Resources”.



