Reformas Fiscais E O Mercado De Fusões E Aquisições

Reformas Fiscais E O Mercado De Fusões E Aquisições

As reformas fiscais e seu impacto no mercado de fusões e aquisições

A reforma fiscal, considerada um dos eventos mais significativos na economia em décadas, ainda não foi plenamente absorvida pelas empresas, nem tampouco pelo ambiente das fusões e aquisições.

Para recapitular, a reforma consiste na substituição dos atuais impostos sobre consumo — como PIS, Cofins, ICMS e ISS — pelo Imposto sobre Valor Agregado (IVA) em sua forma dual. Essa dualidade se dá porque o impacto tributário varia entre estados e municípios: a componente federal é a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), enquanto os estados e municípios terão a parcela do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). A expectativa é que a alíquota máxima fique em torno de 26,5%.

A primeira fase da reforma, que substitui o PIS e a Cofins pela CBS, já está em vigor desde 2027, com alíquota de 8,8%. Essa mudança acarreta efeitos desiguais para empresas que adotam o lucro real ou presumido, penalizando mais essas últimas.

A segunda etapa, que prevê a substituição progressiva do ICMS e do ISS pelo IBS, está programada para começar em 2029. Inicialmente, serão aplicados 10% das novas alíquotas, que evoluirão até atingirem 40% em 2032, com acréscimos anuais de 10%. Neste período, o restante do imposto continuará sendo cobrado segundo as regras vigentes do ISS e ICMS. A transição completa para o IBS ocorrerá em 2033.

Outro ponto fundamental da reforma é a mudança da incidência do imposto, que passa a ser determinada pelo local de destino do produto ou serviço, em vez do local de origem. Essa alteração foi desenhada para acabar com a guerra fiscal, uma prática em que estados oferecem descontos significativos para atrair empresas, gerando uma competição prejudicial e desequilíbrios econômicos.

Exemplos desse cenário incluem municípios como Extrema, que serve como entreposto para medicamentos, e localidades com fábricas de automóveis instaladas mais por incentivos fiscais do que por lógica logística, resultando em custos ambientais elevados e desgaste das infraestruturas viárias.

Com a nova sistemática, espera-se um rearranjo econômico mais eficiente, estimulando a realocação de atividades produtivas para regiões próximas dos grandes centros consumidores, influenciando a localização de fábricas, portos e empresas de serviços intensivos em mão de obra.

É importante destacar que a taxa da CBS será única para todo o país, enquanto a do IBS será definida por cada município, composta por uma alíquota estadual única e uma municipal única. Isso implica que os entes tributantes não poderão mais escolher alíquotas diferenciadas por atividade ao longo do ano, podendo realizar essa definição apenas uma vez por ano, com validade para todo o exercício.

Essa mudança deverá levar os estados e municípios a ajustarem suas alíquotas conforme suas vocações econômicas naturais para otimizar a arrecadação. Cidades como São Paulo e Rio de Janeiro tenderão a atrair indústrias e serviços com contato direto entre cliente e fornecedor. Já áreas menos populosas, com apelo ambiental ou qualidade de vida acentuada, provavelmente reduzirão suas alíquotas para atrair moradores interessados em menor tributação, numa dinâmica semelhante ao que se observa nos Estados Unidos, onde muitos trabalham em Nova York e se aposentam em Miami.

No comércio eletrônico, essa novidade se traduzirá em preços fixados pelos vendedores, mas com valores finais distintos para cada consumidor, em função dos impostos locais aplicados conforme seu endereço.

As decisões corporativas relacionadas a fusões, aquisições e investimentos serão profundamente influenciadas pelas novas alíquotas aplicadas às atividades produtivas e pela localização geográfica dos investimentos, impactando setores de formas diversas. Regiões menos favorecidas tendem a desenvolver polos de inovação e serviços online para atrair trabalhadores qualificados.

Essas transformações afetam diretamente o lucro operacional antes de juros, impostos, depreciação e amortização (EBITDA) de várias empresas, considerando não apenas as novas alíquotas, mas também a capacidade de cada companhia de tomar créditos fiscais. Em geral, o objetivo é eliminar a incidência em cascata dos impostos. Além disso, segmentos B2B sofrerão menos alterações do que os B2C, pois estes últimos não terão como repassar créditos de IVA para o consumidor.

Compreendendo essas mudanças, as avaliações empresariais relacionadas a fusões, aquisições e outras operações corporativas já incluem esses novos parâmetros econômicos e financeiros, influenciando as estratégias de crescimento dos compradores e a precificação de negócios.

Por fim, merece atenção o impacto da reforma do imposto de renda, ainda em debate, especialmente no que tange à tributação de dividendos em 10% para investidores estrangeiros. A atual legislação não prevê mecanismos claros para a devolução de tributos pagos em excesso, o que pode desvalorizar operações envolvendo compradores internacionais, que correspondem a uma parcela significativa do mercado.

Eduardo Boulos é sócio da área de Societário, Fusões e Aquisições e Private Equity do Cascione Advogados.

E-mail: eboulos@cascione.com.br

Colunista Eduardo Boulos — Foto: Arte / Valor InvesteFonte

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