Rioprevidência justifica investimento no Banco Master e reconhece riscos envolvidos
A liquidação extrajudicial do Banco Master revelou aportes de risco realizados pelo fundo de aposentadoria dos servidores estaduais do Rio de Janeiro, o Rioprevidência. Desde 2023, o fundo aplicou cerca de R$ 2,6 bilhões em letras financeiras e títulos de renda fixa vinculados à instituição e sua corretora, conforme auditoria do Tribunal de Contas do Estado (TCE), que já vinha emitindo alertas sobre irregularidades nessas operações há cerca de um ano. Apesar da incerteza quanto à recuperação total dos valores investidos, o governo estadual assegura que os pagamentos a pensionistas e aposentados permanecerão inalterados.
Em resposta ao TCE, Deivis Marcon Antunes, presidente do Rioprevidência, enviou, em fevereiro, um ofício defendendo as operações em letras financeiras do Master, que acumulavam aproximadamente R$ 1 bilhão até meados de 2024. No documento, ele criticou as críticas que questionavam outras operações mantidas pelo fundo com o banco.
Segundo Antunes, “Todo investimento carrega riscos, e a gestão responsável e contínua deles é essencial para uma administração eficiente. A equipe técnica do Rioprevidência fundamenta suas decisões na avaliação constante dos ativos e no cumprimento das normas legais e regulatórias, e não em matérias jornalísticas tendenciosas ou incorretas”.
Decisões e consultas antes dos investimentos
No mesmo ofício, Antunes mencionou que, antes das primeiras operações, foram realizadas consultas a apenas dois bancos de grande porte, que possuem classificações inferiores à do Master. Só em maio de 2024, após elevados investimentos ao banco, foram solicitadas cotações a financeiras concorrentes diretas, mas o Master continuou a ser escolhido para novos aportes, totalizando mais R$ 160 milhões.
Detalhes dos aportes no Banco Master
Os primeiros investimentos do Rioprevidência ocorreram entre novembro de 2023 e abril de 2024, distribuídos em cinco operações que totalizaram R$ 670 milhões. Esses investimentos foram realizados através de letras financeiras, que não contam com a proteção do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), órgão responsável por garantir até R$ 250 mil em certos tipos de aplicações. Mesmo considerando alguns ativos cobertos pelo FGC, a quantia recuperável seria pequena diante do volume total investido.
Em nota oficial, o Rioprevidência informou investimentos de R$ 960 milhões em letras financeiras do Banco Master entre outubro de 2023 e agosto de 2024, sem detalhar aportes feitos nos fundos da corretora do banco. A nota também declarou que a autarquia negocia substituições dessas letras por precatórios federais. Quanto à escolha pelo Master, o fundo alegou que o banco possuía autorização do Banco Central, credenciamento ativo junto ao Ministério da Previdência Social e classificação de risco de crédito considerada “grau de investimento”, sinalizando solidez financeira e credibilidade institucional.
Acompanhamento e alertas do Tribunal de Contas do Estado
Desde o ano anterior, o TCE vinha sinalizando os problemas que tais investimentos poderiam causar. O tribunal iniciou uma investigação acerca da gestão do Rioprevidência, que destinou cerca de 25% de todos os recursos aplicados ao grupo Master. Em maio, a corte identificou irregularidades no processo de habilitação da financeira, que foi cadastrada formalmente apenas um mês depois do começo dos aportes.
Os conselheiros do TCE notificaram o Rioprevidência que novas operações similares poderiam acarretar a responsabilidade total do órgão e de seus gestores sobre eventuais irregularidades. Sem resposta às notificações, em outubro, o tribunal instaurou uma tutela provisória impedindo novas aplicações relacionadas ao Master.
Apesar dos alertas, o Rioprevidência seguiu realizando investimentos, aplicando cerca de R$ 1,1 bilhão em fundos geridos pela corretora do Master entre 20 de maio e 25 de julho, período em que a crise do banco já era amplamente conhecida.
Justificativa das taxas oferecidas
Em audiência no plenário do TCE, em 9 de abril, o ex-diretor de investimentos do Rioprevidência, Euchério Lerner Rodrigues, afirmou que realizou comparações com bancos concorrentes de porte equivalente, mas as condições ofertadas pelo Master eram melhores. Ele explicou: “Entendíamos que era possível adquirir letras financeiras do Banco Master, e em cada uma das nove operações realizadas, as taxas foram avaliadas com base nas condições de mercado para assegurar a melhor rentabilidade em benefício do fundo”. Lerner Rodrigues deixou sua função em março de 2025.
Riscos elevados nos investimentos posteriores ao alerta do TCE
Os aportes realizados após o aviso do tribunal foram expostos a maior risco, focando em fundos da corretora do grupo, que o Banco Central também colocou em liquidação. Um destaque negativo foi o investimento de R$ 100 milhões no fundo Texas I FIA, cuja carteira é composta em 96% por ações da Ambipar, empresa em recuperação judicial que sofreu queda de 97% no valor das ações até pouco tempo atrás.
Investimento inferior à poupança
Outro investimento interessante foi no Arena Fundo de Investimento em Renda Fixa / Título Público, que recebeu R$ 660 milhões, além de anteriores R$ 440 milhões. A aplicação gerou estranheza no TCE, já que o fundo foi aberto em 18 de dezembro de 2024 e o Rioprevidência é o único cotista da carteira, que até agosto apresentou rendimento de 4,05%, inferior à poupança, cuja rentabilidade foi 5,47% no período.
Denúncias e questionamentos sobre os investimentos
O TCE iniciou sua apuração no ano anterior, impulsionado por denúncias do deputado estadual Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSD), que reafirmou exigência de responsabilização após a prisão do controlador do Master, Daniel Vorcaro. Para ele, “um banco de terceiro escalão, classificado pelo Banco Central e oferecendo retornos 130% acima do CDI, representa um investimento com alto risco de perda e pode configurar um esquema semelhante a pirâmide”.
Perspectivas legais e garantias limitadas
O advogado Francisco Costa e Silva, sócio da Bocater advogados, alertou que o Rioprevidência não conta com garantia plena de recuperação do capital aplicado. Todos os ativos do banco compõem um patrimônio para pagamento de credores, e o fundo constituirá um credor entre outros. Ele ressaltou que o banco Master apresenta incertezas sobre a lisura de seus balanços, e que somente após a intervenção do Banco Central e a conclusão das auditorias, que podem levar meses, haverá maior clareza sobre a situação. Ele também destacou que o valor assegurado pelo FGC, de até R$ 250 mil por investidor, representa um montante muito pequeno diante dos aportes feitos pelo fundo.



