Reforma tributária: adaptação de processos e sistemas até 2026 representa desafio para empresas
A implementação da reforma tributária sobre o consumo demanda que as empresas revisem e atualizem seus processos de gestão e sistemas de emissão de notas fiscais para evitar complicações a partir de 2026. Especialistas destacam que uma nova plataforma tecnológica, sem precedentes globais e com capacidade 150 vezes maior que o PIB, será lançada no próximo ano para gerenciar o recolhimento de impostos sobre produtos e serviços.
Esse sistema inovador servirá para operacionalizar o pagamento dos futuros impostos sobre valor agregado (IVA) previstos na reforma tributária, que foi aprovada em 2024 pelo Congresso Nacional e sancionada no início de 2025 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Atualmente em fase de testes, o principal objetivo da Receita Federal é que essa plataforma funcione efetivamente a partir de 2026 sem cobrança imediata, já que a alíquota prevista será reduzida a 1%, com possibilidade de abatimento em outros tributos. A partir de 2027, com a extinção do PIS e da Cofins federais, entrará em vigor o sistema de “split payment” para a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), voltado especialmente para negociações entre empresas, sem incluir o varejo. Já entre 2029 e 2032 acontecerá a transição gradual do ICMS estadual e do ISS municipal para o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), com a respectiva redução e aumento paulatinos das suas alíquotas.
A Receita Federal minimiza as preocupações e não prevê um aumento significativo na complexidade da emissão de notas fiscais para as empresas já em 2026.
Opiniões de especialistas sobre os desafios para as empresas
Fernando Brolo, especialista em tecnologia da informação e Chief Sales & Marketing Officer da Logithink, ressalta que o principal obstáculo para as empresas será a adaptação ao novo formato de entrada de documentos exigido pelo sistema da Receita Federal.
Segundo ele, essa mudança trará impactos práticos como dificuldades para movimentação de mercadorias, problemas no contas a pagar e na liquidação das faturas, além do risco do não aproveitamento dos créditos tributários, o que afetaria diretamente o fluxo de caixa das companhias.
Brolo alerta que as empresas tendem a subestimar a complexidade de receber e processar as notas fiscais dos fornecedores que passarão a conter cerca de 200 novos campos. Caso o sistema de gestão (ERP) não consiga interpretar e validar essas informações, o fluxo será interrompido.
Reginaldo Stocco, CEO da vhsys, empresa de tecnologia para micro e pequenas empresas, destaca que o novo sistema exigirá das empresas uma reorganização do controle fiscal e contábil, atualização do software de gestão, simulações de cenários, planejamento do fluxo de caixa, capacitação das equipes e revisão dos processos internos.
Stocco observa que a reforma altera a estrutura de cálculo e declaração dos impostos, forçando as micro e pequenas empresas a reavaliar o regime tributário adotado e os procedimentos de emissão de notas fiscais. Ele aconselha que iniciar esse processo desde já trará uma vantagem competitiva em 2026 e deve ser encarado como uma oportunidade para modernização das operações.
Para Jhonny Martins, vice-presidente do SERAC, hub especializado em soluções contábeis, educacionais e de gestão corporativa, é fundamental que as empresas integrem seus sistemas de gestão, emissão de notas fiscais e meios de pagamento com bancos e plataformas de arrecadação, o que exigirá investimentos tecnológicos.
Martins destaca que adaptar os negócios de forma antecipada evitará que o imposto se torne um obstáculo ao crescimento futuro e que o módulo “Split Payment” oferece maior previsibilidade ao fisco, demandando maturidade financeira das organizações. Ele afirma que a preparação antecipada contribuirá para qualquer empresa superar essa transição com vantagem competitiva.
Cláudio Costa, diretor da Selbetti Business Consulting, avalia que a adaptação vai além do mero ajuste de sistemas. Segundo ele, o processo requer integração entre áreas, uso de automação inteligente e desenvolvimento de indicadores confiáveis, tornando a reforma não só um desafio para conformidade fiscal, mas também um impulso para a transformação digital e melhoria das rotinas fiscais.
Costa ainda alerta que o custo da adaptação tardia pode ser elevado, incluindo perda de competitividade, exposição a autuações fiscais e desorganização financeira. Ele reforça que a reforma não é opcional e que a urgência para adequação serve para garantir a continuidade operacional das empresas.
Receita Federal descarta aumento de complexidade para as empresas
A Receita Federal afirma que não haverá aumento significativo na dificuldade de emissão de notas fiscais com a reforma tributária e descarta cenários caóticos a partir de 2026.
O órgão explica que os campos exigidos nas notas fiscais permanecerão semelhantes aos de hoje, incluindo informações como CNPJ ou CPF dos compradores e vendedores, quantidade de produtos, valores e códigos tributários.
A principal novidade será a obrigatoriedade de o empresário indicar se a venda é destinada ao setor privado, a órgãos públicos ou a entidades vinculadas ao Programa Universidade para Todos (Prouni).
No início, as empresas precisarão inserir um código para cada produto ou serviço, permitindo que o sistema reconheça automaticamente o item na hora da venda e possibilite a emissão automática da nota fiscal.
Marcos Flores, gerente do Programa de Implementação dos Sistemas da Reforma Tributária do Consumo na Receita, recomenda que os empresários participem das transmissões ao vivo e leiam os manuais da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) para se familiarizarem com o sistema.
Flores lembra que a inclusão de novos campos nas notas fiscais é um procedimento rotineiro, geralmente responsabilidade das empresas de software, e não resultará em mudanças perceptíveis para o usuário final que utiliza sistemas de gestão e emissão de notas prontos.
Ele destaca que o contribuinte precisará apenas confirmar se a calculadora disponibilizada gratuitamente pela Receita está integrada ao seu sistema de emissão. Com isso instalado, a nota fiscal será emitida normalmente, e para o atendente na frente de caixa, nada mudará.
O sistema foi projetado para oferecer incentivos econômicos positivos ao empresário, além de ampliar a segurança no cumprimento das obrigações fiscais.
Segundo Flores, hoje os empresários precisam recorrer a contadores e advogados para interpretar a legislação, configurar sistemas e emitir documentos fiscais, torcendo para que a interpretação coincida com a da Receita. Com a nova calculadora oficial, esse processo se tornará muito mais seguro e transparente.
Em relação ao controle dos créditos tributários relativos a etapas anteriores da cadeia produtiva — que deverão ser regularizados rapidamente conforme as premissas da reforma —, três situações serão contempladas:
- Apropriação integral: quando o tributo foi devidamente pago pelo fornecedor ou adquirente, gerando crédito para o comprador;
- Apropriação parcial: quando o tributo foi pago parcialmente, possivelmente em casos de vendas parceladas ainda não quitadas;
- Não apropriado: quando o pagamento ainda não foi realizado, podendo se referir a vendas a prazo com vencimentos futuros ou consumo final.
No cenário de crédito não apropriado, o empresário pode emitir um Documento de Arrecadação de Receitas Federais (Darf) para pagamento como adquirente e, ao pagar o fornecedor posteriormente, transferir apenas o valor líquido. Esse recolhimento pelo adquirente será utilizado quando o sistema “split payment” não for aplicável. Alternativamente, pode-se aguardar o pagamento do fornecedor ou utilizar futuramente o “split payment”, que efetua o recolhimento imediato.



