Veste do BTG Pactual Foca em Preço Cheio e Reduz Saldão nas Marcas

Veste do BTG Pactual Foca em Preço Cheio e Reduz Saldão nas Marcas

Veste, controlada pelo BTG Pactual, ajusta estratégia de Le Lis e Dudalina com menos promoções e foco em preços integrais

Fundado nos anos 1980, o grupo dono da Le Lis começou sua trajetória como outlet; em outubro de 2025, a gestora ligada a Daniel Vorcaro vendeu sua participação para o BTG Pactual, banco liderado por André Esteves.

Na década de 1980, o Brasil enfrentava hiperinflação e tendências de moda como blazers com ombreiras e cores neon. Foi nesse cenário que Rahyja Afrange e Traudi Guida fundaram, em 1982, a Estoque, uma espécie de outlet que comercializava saldos de marcas brasileiras como Zoomp, Gloria Coelho e Fórum. Em 1988, a loja passou a criar sua própria grife, a Le Lis Blanc (atualmente conhecida apenas como Le Lis). Com o passar dos anos, o grupo, renomeado como Restoque, incorporou outras marcas, incluindo Bo.Bô, Dudalina, Individual e John John.

Em 2022, após uma reestruturação financeira que converteu dívidas em ações, o grupo adotou o nome Veste e reformulou completamente sua estratégia, deixando de lado as promoções excessivas: atualmente, 88% das vendas são feitas a preços integrais, um salto significativo diante dos 60% registrados há seis anos.

Com a perspectiva de encerrar 2025 como o ano mais lucrativo desde 2020, quando apresentou um plano de recuperação extrajudicial, a Veste também passou por uma mudança no acionariado majoritário. Em outubro, a gestora WNT, ligada a Daniel Vorcaro, vendeu sua participação de 49,7% para o BTG Pactual, comandado por André Esteves.

Nos primeiros nove meses de 2025, o Ebitda saltou de R$ 2 milhões, em igual período de 2020, para R$ 189,9 milhões, um crescimento de quase 87 vezes. O lucro líquido também reverteu perdas anteriores, alcançando R$ 15 milhões entre janeiro e setembro deste ano, frente a um prejuízo de R$ 92 milhões em 2020. Esse avanço decorreu não só da melhora financeira, mas também de ajustes operacionais.

A empresa otimizou suas coleções, reduziu estoques, fechou algumas lojas e reformou as unidades remanescentes. Paralelamente, revisou suas estratégias de vendas digitais e para lojas multimarcas. A redução drástica das liquidações reflete essa mudança, principalmente em marcas cujo tíquete médio é elevado — Bo.Bô é a mais cara, com R$ 3.047, enquanto John John tem o mais baixo, cerca de R$ 641.

O grupo passou a utilizar dados e modelos preditivos para encomendar coleções que se adequem ao ritmo de consumo, criando um sistema em que peças que não vendem em determinadas lojas retornam ao centro de distribuição em São Paulo para “descansar”, retornando depois para unidades onde apresentam melhor desempenho. Isso evita a percepção de descontos frequentes, preservando o valor de marca. Apenas os itens remanescentes após essas etapas são direcionados ao outlet.

No que diz respeito ao mix de produtos, a estratégia mostrou avanços ao adaptar as coleções outono-inverno, levando em consideração temperaturas mais amenas fora da estação. Em vez de investir em casacos pesados, mais caros e importados, a empresa aposta em peças clássicas que permitem combinação em camadas, o que torna as compras mais flexíveis para os clientes, segundo o CEO Alexandre Afrange.

Expansão por franquias e crescimento nas vendas digitais

A conversão de dívidas em ações proporcionou à Veste maior fluidez financeira, o que possibilitou a reforma das lojas da Le Lis, principal marca do grupo, responsável por metade da receita. Atualmente, 40% das unidades já operam sob o novo conceito, sendo que as lojas atualizadas há pelo menos um ano registraram aumento de 58% no Ebitda, conforme explicou a CFO Elisa Bastos de Lima.

Na Dudalina, reconhecida pelas camisas sociais, as lojas reformadas tiveram crescimento de 30% no Ebitda. Apesar de ter perdido força nos últimos anos, a marca tem se alinhado às mudanças no dress code corporativo, que se tornou mais casual após a pandemia. Dudalina também é foco de expansão via franquias, com 21 unidades nesse formato e 37 lojas próprias atualmente, mirando alcançar 30 franquias no início de 2026. Essa escolha é reforçada pela menor necessidade de liquidações, tornando o negócio atrativo para franqueados. O mesmo modelo deverá ser aplicado à John John, marca especializada em jeans.

Atualmente, o grupo opera 187 lojas e planeja inaugurar brevemente unidades de Dudalina, John John, Le Lis e Bo.Bô no shopping Morumbi, que também abriga lojas com conceito moderno da Renner e a terceira unidade da H&M no Brasil.

Além das lojas físicas, o digital ganha protagonismo. O canal online, composto basicamente pelos sites das marcas, já representa 19% do faturamento, impulsionado pelo lançamento recente de aplicativos para cada marca do grupo. O atacado, que cresceu no terceiro trimestre em função do período de fim de ano, responde por 22,4% da receita, mas a empresa prospecta aumentar ainda mais sua participação ao longo do ano.

Reconstruindo o valor das marcas e preparação para o futuro

Parte do reposicionamento da Veste foca em restaurar a imagem de alto valor agregado das marcas que a Restoque consolidou no mercado. Quando abriu capital em 2008, a varejista brasileira de moda premium foi vista como pioneira e referência do setor. Contudo, atualmente suas ações apresentam baixa liquidez e não contam com cobertura por bancos de investimento.

Após a aquisição pelo grupo Artesia, os fundadores diminuíram sua participação, embora permanecessem envolvidos operacionalmente, desencadeando um ciclo de expansão acelerada: após o IPO, o grupo adquiriu a Bo.Bô, em 2011 entrou com a marca John John e, dois anos depois, incorporou Dudalina, Individual e Base. A partir de 2014, o endividamento da companhia aumentou, situação agravada pela pandemia de 2020.

Alexandre Afrange, fundador que reassumiu o comando em 2023, afirma que a reconstrução da empresa tem sido gradual, porém sólida. Ele esteve à frente da companhia entre 2000 e 2014 e retornou inicialmente para a Le Lis em 2020, depois como diretor operacional até reassumir o cargo de CEO.

Afrange, irmão de Rahyja Afrange, uma das sócias-fundadoras falecida em 2015, participou desde os primeiros passos da Istoque e Le Lis, que teve sua primeira loja em um ponto valorizado no shopping Iguatemi na avenida Faria Lima, inicialmente com apenas 47 metros quadrados, mas que conquistou sucesso, expandindo para uma loja de 300 metros quadrados em shopping de luxo.

Para o executivo, o grande desafio é preparar a empresa para uma sucessão organizada, assegurando a longevidade das marcas. A base ativa de clientes da Le Lis cresceu 4,4%, reforçando o interesse contínuo dos consumidores. Afrange destaca que muitas grifes brasileiras perderam força após a saída dos fundadores ou pela falta de gestão focada na preservação da identidade da marca, citando exemplos como Forum e Zoomp.

Enquanto isso, concorrentes de segmento similar, como a Inbrands (dona da Ellus e Richards), enfrentam dificuldades, com vendas em queda e prejuízos crescentes, que atingiram R$ 91 milhões em 2025.

Transferência de controle de Vorcaro para o BTG Pactual

Em 2022, a gestora WNT, que era credora da empresa, apresentou uma proposta de conversão da dívida em ações, aprovada por 97% dos credores, reduzindo o passivo da empresa de R$ 1,76 bilhão para R$ 130 milhões. Essa iniciativa aliviou a estrutura financeira e colocou a WNT, ligada a Daniel Vorcaro, como controladora com 56% do capital.

Naquele ano, também ocorreu um agrupamento das ações, que possuíam preço baixo, e a realização de aumento de capital de R$ 100 milhões destinado à reforma das lojas, momento em que a Restoque adotou o nome Veste.

Posteriormente, em outubro de 2025, a participação da WNT, que correspondia a 49,7%, foi vendida ao BTG Pactual, em meio à crise enfrentada pelo Banco Master, do qual Vorcaro é associado. Segundo Afrange, o BTG tem confiança no desempenho da empresa e atualmente a Veste não possui nenhuma relação financeira com o Banco Master nem exposição a seus ativos.

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