Por que Fortunas Brasileiras Estão Transferindo US$ 1,5 Bilhão para Dubai
A busca por estabilidade econômica, segurança jurídica e a inexistência de imposto sobre herança são os principais fatores que têm motivado brasileiros a estruturarem seus patrimônios nos Emirados Árabes Unidos.
Segundo o relatório anual da consultoria Henley & Partners Group, que atua globalmente em migração por investimento, os Emirados Árabes devem receber aproximadamente 9,8 mil novos milionários ao longo de 2025, um crescimento de mais de 46% em comparação com o número previsto para 2024, que era cerca de 6,7 mil.
Dados do Dubai International Financial Centre (Difc) indicam a presença de 120 escritórios especializados em gestão familiar, administrando juntos cerca de US$ 1,2 trilhão (aproximadamente R$ 4,48 trilhões). Nos últimos tempos, o Difc observou aumentos significativos nos registros de entidades de gestão patrimonial, fundações e fundos de hedge.
Embora o Difc não divulgue a origem exata desses fundos, informações da plataforma MH/Q, especializada em patrimônio privado para famílias de alta renda, mostram que brasileiras já estruturam cerca de US$ 1,5 bilhão (R$ 8,1 bilhões) nos Emirados. Esse número representa um avanço de 66,6% em relação a 2024, quando o montante era US$ 900 milhões. O número de famílias brasileiras com patrimônio estruturado em Dubai subiu de 18 para 30 no último ano.
Para a advogada paulista Kath Zagatti, responsável pela área de private wealth na MH/Q, é perceptível uma migração de jurisdição, com brasileiros se afastando de locais tradicionais como a Suíça e optando por destinos mais recentes, como Dubai.
Fatores que atraem brasileiros para Dubai
O movimento observado na MH/Q reflete uma tendência mais ampla, com cerca de 400 empresas sediadas em Dubai focadas no atendimento de grandes fortunas estrangeiras. Wilson Barcellos, CEO da Azimut Brasil Wealth Management, destaca que Dubai oferece um marco legal moderno que favorece negócios familiares, com estruturas reguladas para trusts e family offices. Além disso, a cidade mantém alto padrão de segurança e infraestrutura global.
Outros benefícios que chamam a atenção incluem estabilidade política e econômica, além do acesso a instrumentos complexos para proteção patrimonial, como trusts e fundações. A ausência de imposto sobre herança e a isenção do imposto de renda para pessoa física tornam o destino ainda mais atraente.
O perfil dos investidores brasileiros mudou recentemente, passando de herdeiros para empresários de médio porte, com fortunas entre US$ 20 milhões e US$ 80 milhões, atraídos pela combinação de ambiente favorável aos negócios, residência fiscal e proteção de patrimônio.
Dubai é considerado um paraíso fiscal?
Apesar de muitos acreditarem que os Emirados Árabes Unidos constituem um paraíso fiscal, a realidade é diferente. A Receita Federal do Brasil, por meio da Instrução Normativa nº 2.265 de maio de 2025, removeu oficialmente o país da lista de jurisdições com tributação favorecida.
O país instituiu um imposto corporativo de 9% e foi classificado como o 11º centro financeiro mais competitivo do mundo segundo o Global Financial Centres Index, superando cidades como Frankfurt, Washington, Genebra e Tóquio. Já São Paulo, melhor colocada no Brasil, aparece apenas na 89ª posição.
Outro ponto crucial está nas diferenças das estruturas locais: em Dubai, family offices, holdings e fundações são entidades distintas com funções específicas e reguladas, ao contrário do que ocorre no Brasil onde os termos podem ser usados de forma genérica.
O investimento imobiliário é a principal modalidade utilizada pelos brasileiros na região, especialmente como um meio para obtenção do Golden Visa, que exige aporte mínimo de 2 milhões de dirhams (aproximadamente US$ 500 mil ou R$ 2,7 milhões). Conforme Kath Zagatti, o mercado imobiliário local segue aquecido e é foco principal desses investidores.
Atenções e desafios do mercado em Dubai
Infelizmente, apesar das vantagens fiscais e regulatórias, existem riscos legais e culturais que demandam prudência. Ana Claudia Utumi, advogada tributarista da Utumi Advogados, ressalta a importância de escolher uma assessoria que priorize o cliente, já que existem situações em que recursos ficam imobilizados por longos períodos, algo que alguns investidores só descobrem após fecharem contratos.
A influência da lei islâmica (Sharia Law) também impõe restrições, como a proibição de cobrança de juros, o que limita produtos financeiros tradicionais como renda fixa. Instrumentos financeiros locais, como os títulos islâmicos, remuneram através de participação nos lucros, requerendo compreensão profunda do investimento.
Além disso, em determinadas jurisdições árabes, litígios podem ser resolvidos pela autoridade máxima do país em vez de tribunais comuns, algo que deve ser levado em consideração ao firmar contratos, segundo Utumi.
Outro alerta diz respeito à proliferação de intermediários sem licenciamento, aproveitando o crescimento do mercado e oferecendo serviços duvidosos, conforme alerta Kath Zagatti.
A adaptação cultural é outro ponto sensível, desde o clima quente no verão até as regras sociais durante o Ramadã. Wilson Barcellos pondera que, apesar das vantagens, montar um family office em Dubai não é uma solução mágica e deve ser avaliada cuidadosamente considerando custos, cultura e perfil do patrimônio.



