Indústria brasileira prevê ritmo mais lento em 2025; tarifa dos EUA é obstáculo
A indústria nacional deve apresentar crescimento de 1,7% neste ano, resultado inferior ao registrado no ano anterior, conforme projeção da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Esse desempenho desacelerado é puxado principalmente pelo segmento de transformação. Um dos desafios que restringe a atividade industrial é a conjugação de juros elevados no Brasil, maior entrada de importações e expectativas de queda nas exportações, agravada pelo aumento das tarifas dos Estados Unidos sobre produtos brasileiros.
Mário Sérgio Telles, diretor de Economia da CNI, observa que, apesar de um mercado interno com demanda crescente devido ao aumento da renda e bom desempenho do mercado de trabalho, essa elevação da procura tem sido quase totalmente suprida por produtos importados, resultando numa estagnação da indústria local nos últimos meses.
Uallace Moreira, secretário do Desenvolvimento Industrial, Inovação, Comércio e Serviços do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), ressalta que, mesmo diante do ambiente desafiante com juros altos e barreiras tarifárias dos EUA, o setor industrial apresenta uma trajetória positiva, projetando um crescimento acumulado entre 1,5% e 1,8% em 2025, com o PIB nacional crescendo em torno de 2,5%. Ele destaca que a alta taxa de juros impacta especialmente os setores de bens de consumo duráveis e investimentos em máquinas e equipamentos.
Segundo Telles, segmentos mais ligados à renda das famílias e menos sensíveis à oscilação das taxas de juros, como o setor alimentício, têm registrado resultados favoráveis dentro do cenário industrial.
Perspectiva negativa e impactos da política monetária
A confiança dos empresários do setor industrial segue em queda. A Sondagem da Indústria de Transformação, divulgada mensalmente pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV IBRE), indica forte retração no Índice de Confiança da Indústria (ICI). Em agosto, o índice registrou redução de 4,4 pontos, a maior desde os períodos críticos da pandemia.
Stéfano Pacini, economista da FGV IBRE, atribui esse pessimismo principalmente à elevada taxa de juros vigente no país, que onera o crédito e dificulta o financiamento tanto para aquisição de bens duráveis quanto para investimentos que ampliem a capacidade produtiva. Os empresários tendem a adotar uma postura mais cautelosa diante desse cenário, reavaliando investimentos e expansões.
Pacini reforça que, apesar dos impactos negativos no curto prazo, essa política monetária rígida é indispensável para controlar a inflação e estabilizar a moeda nacional, passando necessariamente pela desaceleração das atividades econômicas.
Rafael Cagnin, diretor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), destaca que a desaceleração da indústria está profundamente relacionada a causas internas, com a elevação dos juros desde o final do ano passado reduzindo o dinamismo especialmente nos segmentos que dependem intensamente do crédito, como bens duráveis para consumo e investimento.
Barreiras comerciais americanas dificultam retomada
A imposição de uma tarifa adicional de 50% sobre produtos brasileiros pelos Estados Unidos, em vigor desde 6 de agosto, representa um desafio extra para a indústria nacional. O presidente americano Donald Trump anunciou inicialmente um aumento de 40%, somado a tributos já existentes, totalizando a alíquota de 50% aplicada atualmente.
Embora o governo dos EUA tenha justificado essa medida sob motivos políticos, uma lista de exceções foi divulgada, excluindo setores sensíveis para os norte-americanos, como o de aeronaves, que inclui a Embraer.
Em resposta, o governo brasileiro lançou o Plano Brasil Soberano, que contempla ações como uma linha de crédito de R$ 30 bilhões para auxiliar empresas afetadas por essas tarifas, além de um aporte adicional de R$ 10 bilhões do BNDES para companhias atingidas por tributos menores aplicados pelos EUA.
O secretário Uallace Moreira explica que essas medidas foram idealizadas após diversas reuniões com entidades produtivas e empresários, buscando contemplar as principais demandas do setor privado, mas que o plano poderá ser ajustado conforme a necessidade.
Apesar das iniciativas serem bem avaliadas no geral, a indústria ainda enfrenta dificuldades para se adaptar ao perfil dos consumidores americanos. Por exemplo, produtos como calçados e autopeças são produzidos com especificações alinhadas a padrões e estilos do mercado dos EUA, dificultando a rápida redirecionamento das exportações para outros destinos.
Rafael Cagnin sublinha que, a curto prazo, ações como o Plano Brasil Soberano dão suporte às empresas mais expostas, porém, para médio e longo prazo, é fundamental manter negociações abertas com os Estados Unidos, ao mesmo tempo em que se busca diversificar a pauta exportadora, ampliando o número de produtos e o leque de mercados atendidos.
Ele ainda aponta que esse processo depende de avanços em competitividade e redução do Custo Brasil, aspectos pendentes que deveriam ter sido tratados anteriormente. A implementação de acordos como o Mercosul-União Europeia e outros tratados bilaterais seriam caminhos para ampliar o acesso a novos mercados.



