Cada conselho possui sua própria identidade
Na esfera dos conselhos de administração, a ideia de um modelo único e igual para todos simplesmente não se aplica. Cada colegiado tem suas particularidades, e compreender essa diversidade é essencial para uma atuação eficiente.
Por Sonia Consiglio — São Paulo
22/10/2025 07h00 Atualizado agora
Com frequência, recebo questionamentos como: “Os conselhos de administração estão realmente incorporando a agenda ESG em suas decisões?” ou “Os temas ligados ao capital humano fazem parte das discussões regulares dos conselhos?”. Entendo o interesse, afinal, o conselho de administração representa o ápice da governança corporativa, responsável por definir o direcionamento estratégico das organizações.
Atuo em conselhos desde 2020 e minha resposta consistentemente é: “Cada conselho é um conselho”. Não há dois colegiados iguais, pois muitos elementos influenciam essa dinâmica, entre eles a cultura organizacional, o histórico da empresa, o estilo das lideranças, a composição acionária e os perfis dos conselheiros.
Um aspecto que me fascina na minha atuação é a oportunidade de analisar profundamente cada conselho, tentar entender sua dinâmica, cultura implícita, quais fatores fazem com que as opiniões do(a) presidente sejam realmente ouvidas, e o que mais impacta os membros a determinar as pautas das reuniões. Esse conhecimento permite que eu contribua de maneira mais estratégica, propondo e estimulando debates relevantes.
Ter essas percepções, mesmo que parciais, torna o trabalho em cada conselho único. O que funciona com naturalidade em um grupo pode demandar articulação cuidadosa em outro. No mundo dos conselhos, o conceito “tamanho único serve para todos” é totalmente ineficaz.
Quero dedicar um momento para reconhecer a importância crucial do trabalho das secretarias de governança dentro dos conselhos. Nos conselhos em que participo, conto com profissionais qualificados, que possuem o perfil ideal para a complexa tarefa de mediação, organização e sensibilidade que o cargo exige. Gesto com gratidão a esses governance officers que são essenciais no dia a dia.
Embora a singularidade dos conselhos seja a essência da reflexão, é válido buscar respostas comuns para as questões levantadas inicialmente. Nessa busca, estudos e pesquisas fornecem bons subsídios, mesmo com as limitações naturais de amostra e momento em que foram realizados.
Agenda ESG nos conselhos
Sobre a questão da prioridade da agenda ESG, uso como referência a publicação recente “Board Scorecard: a atuação dos conselhos frente aos impactos climáticos e à estratégia net zero”, lançada pelo Chapter Zero, ligado ao IBGC. A terceira edição deste estudo ouviu 90 participantes entre conselheiros, CEOs e executivos. Destaco duas perguntas relevantes:
1. “O conselho compreende as implicações das mudanças climáticas?”
- 75,6% responderam que concordam ou concordam totalmente;
- 11,1% ficaram neutros;
- 13,3% discordaram ou discordaram totalmente.
2. “O tema das mudanças climáticas é discutido em pelo menos quatro reuniões do conselho por ano, com objetivos definidos e informações consolidadas?”
- 37,8% concordaram ou concordaram totalmente;
- 20% permaneceram neutros;
- 42,2% discordaram ou discordaram totalmente.
Refletindo sobre esses dados, chama atenção o aparente paradoxo que, apesar de 75,6% reconhecerem a importância das mudanças climáticas, apenas 37,8% confirmam que o tema faz parte efetiva das reuniões regulares. Talvez isso indique concorrência de pautas ou prioridades distintas em cada conselho. Ainda assim, é positivo notar um grau significativo de conscientização acerca do assunto.
Foco em capital humano nas discussões
Para abordar a frequência com que as questões relacionadas a capital humano são discutidas, trago a pesquisa “2025 Annual Corporate Directors Survey”, da PwC. Uma das perguntas apresentava uma lista de nove temas, e “Gestão de Talentos” liderou a lista com os seguintes resultados:
- 72% dos entrevistados afirmaram que o tema é tratado em todas as reuniões;
- 20% disseram que aparece em pelo menos duas reuniões;
- 6% relatam que o tema é discutido uma vez;
- 2% disseram que o tema nunca foi abordado.
Esse cenário revela que a gestão de pessoas está entre as prioridades mais constantes nos conselhos, o que é um indicativo animador para a valorização do capital humano.
Tendências para os conselhos em 2025
Todo início de ano, reviso pesquisas que indicam as principais tendências para o trabalho dos conselhos durante o período seguinte. Esses estudos são fundamentais para fundamentar palestras, cursos e escritos. Embora o mundo corporativo não mude de forma abrupta, é útil projetar o futuro.
Assim, compartilho a “Pesquisa de Tendências e Prioridades 2025” da NACD (National Association of Corporate Directors), entidade americana de governança corporativa. A lista abaixo apresenta os dez temas que dominarão as atenções nos conselhos, com maior ou menor destaque dependendo do conselho:
- 51% Mudanças nas condições econômicas;
- 46% Exigências regulatórias;
- 41% Ameaças à segurança cibernética;
- 37% Competição por talentos;
- 31% Volatilidade geopolítica;
- 30% Inteligência Artificial;
- 29% Disrupções crescentes nos modelos de negócio;
- 28% Inflação;
- 27% Avanços tecnológicos;
- 27% Distúrbios nas cadeias de suprimentos.
Obviamente, no Brasil, devemos ainda considerar a influência do ano eleitoral e suas singularidades locais.
Sonia Consiglio é SDG Pioneer pelo Pacto Global da ONU e especialista em Sustentabilidade.