Empresas Disputam Valor Bilionário Para Evitar Nova Tributação sobre Dividendos
Com a implementação da Lei 15.270 em 2025, que trouxe isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil por mês, passou a vigorar a cobrança de 10% sobre lucros e dividendos distribuídos. Em função disso, muitas empresas estão antecipando assembleias para aprovar a distribuição ou capitalização das reservas e lucros acumulados antes do prazo limite.
A partir de janeiro de 2026, haverá retenção de 10% na fonte para pagamentos mensais feitos a pessoas físicas com renda superior a R$ 50 mil, e rendimentos acima de R$ 600 mil anuais terão tributação mínima assegurada. Dessa forma, as empresas precisam regularizar suas operações até as 23h59 do último dia de dezembro para evitar a tributação.
Segundo a Quantum Finance, entre 1º de setembro e 2 de dezembro de 2025, foram registrados 59 anúncios de dividendos e juros sobre capital próprio (JCP) na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), superando os 56 do mesmo período em 2024. Entre as companhias que já fizeram anúncios expressivos estão Vale, Itaú e WEG.
O total dos proventos ainda será divulgado nos resultados do quarto trimestre, previstos para o início de 2026. No entanto, dois estudos indicam que 2025 poderá ser um ano recorde para distribuição de dividendos na bolsa brasileira. Segundo Einar Rivero, da consultoria Elos Ayta, de janeiro a setembro deste ano foram pagos R$ 227,27 bilhões, 6,33% a mais que os R$ 209 bilhões do mesmo intervalo em 2024.
A análise das consultorias XP e Eleven Financial aponta que só em dezembro os dividendos anunciados somam cerca de R$ 30 bilhões, com expectativa de mais R$ 30 bilhões para o começo de 2026. A XP estima ainda que o total pode alcançar até R$ 84 bilhões.
Embora 2025 inicialmente estivesse dentro da normalidade, a mudança na legislação estimulou anúncios extraordinários e bilionários, como os pagos por Vale e Itaú. Isso deve elevar a média da distribuição de lucros entre este ano e o próximo, conforme analista Fernando Siqueira, da Eleven Financial.
Aspectos Críticos e Preocupações com a Mudança
A alta recente da B3, que atingiu mais de 161 mil pontos em determinados dias, poderia indicar a antecipação dos dividendos, mas para o codiretor da Azimut Brasil Wealth Management, Eduardo Carlier, ainda não há certeza sobre isso, pois os dividendos podem ser revertidos em outras formas de investimento.
Carlier destaca que ainda é cedo para avaliar se essa corrida para distribuir dividendos resultará em redução de pagamentos futuros ou pressão sobre o caixa das companhias. De toda forma, a nova regra já vem causando mudanças estruturais na política de remuneração das empresas. Ele também cita que iniciativas como as da Eletrobras (atual Axia Energia), envolvendo alternativas para distribuição, podem se tornar mais frequentes.
Um aumento no dividend yield seria vantajoso para os acionistas, contanto que os pagamentos sejam sustentáveis. O analista alerta ainda para o risco de algumas companhias se endividarem para manter os dividendos, prática considerada prejudicial.
Desafios Jurídicos Envolvidos
Além de movimentar tesourarias, auditores e consultorias, a proximidade da vigência da nova legislação acarreta debates em escritórios de advocacia. Há preocupação com o que pode ser uma “tempestade perfeita” combinando insegurança jurídica, dificuldades operacionais e falta de sincronia entre a tributação da pessoa jurídica e física.
Segundo o tributarista Diego Miguita, sócio do escritório Tauil & Chequer Advogados, que atua em colaboração com o americano Mayer Brown, as empresas estão reorganizando suas estruturas, antecipando destinação de reservas e adotando estratégias que podem provocar até fuga de capital.
Ele ressalta a impossibilidade prática de apurar o lucro de 2025 no último dia do ano-calendário, razão pela qual as companhias antecipam deliberações para lucros em formação e reservas. Além disso, o conflito possível entre a legislação vigente e a Lei das Sociedades Anônimas, que determina que dividendos só devem ser pagos no exercício social em que são declarados, gera incertezas sobre interpretações futuras em instâncias administrativas e judiciais.
Outra tática adotada é a distribuição antecipada de reservas de lucro ainda em 2025, especialmente quando há dinheiro ocioso sem destinação clara. Algumas companhias pagam dividendos e, em seguida, captam recursos para recompor o caixa ou convertem valores em dívidas com sócios.
Impactos nas Remessas ao Exterior
Em 2 de dezembro, a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado aprovou o Projeto de Lei 5.473/2025, que estende o prazo para a distribuição de lucros sem incidência de imposto, permitindo que os lucros de 2025 sejam liberados até 30 de abril de 2026, e não mais até 31 de dezembro deste ano.
Caso a proposta avance, as empresas ganhariam quatro meses adicionais para decidir sobre o destino dos lucros, ficando ainda sujeitas a análise na Câmara dos Deputados e à sanção presidencial.
Independentemente disso, estudos do Itaú Unibanco indicam que a nova regulamentação poderá agravar a deterioração da taxa de câmbio no curto prazo, já que investidores podem antecipar remessas maiores de lucros e dividendos para o exterior ao final do ano. A expectativa é de que essas remessas fiquem entre US$ 25 bilhões (R$ 132,75 bilhões) e US$ 35 bilhões (R$ 185,85 bilhões), bem acima da média histórica de US$ 15 bilhões.



