Isenção do Imposto de Renda reduz número de contribuintes no Brasil e afasta país de padrões de nações desenvolvidas
A recente ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda para rendas até R$ 5 mil mensais, que começa a valer a partir de 2026, foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e deve tirar cerca de 10 milhões de pessoas da lista de contribuintes, conforme projeções da equipe econômica. Essa medida, que favorece principalmente a classe média brasileira em um ano eleitoral, contribui para que o Brasil fique ainda mais longe do modelo tributário de países desenvolvidos, onde uma parcela maior da população está sujeita ao pagamento do Imposto de Renda.
A tributação sobre a renda possui o objetivo de onerar principalmente os indivíduos de maior riqueza, enquanto o forte peso tributário sobre o consumo — característica que permanece inalterada após a reforma tributária brasileira — desfavorece majoritariamente quem possui menor capacidade econômica.
Para viabilizar a ampliação da faixa de isenção e a redução do imposto para quem ganha até R$ 7.350, o governo aprovou no Congresso uma tributação mínima de 10% sobre as rendas superiores a R$ 50 mil mensais, incluindo rendimentos provenientes de lucros, dividendos e aluguéis.
Número de declarantes no Brasil comparado com países desenvolvidos
Dados recentes da Receita Federal indicam que, em 2025 (ano-base 2024), 45,64 milhões de pessoas físicas entregaram declaração do Imposto de Renda, o que representa aproximadamente 41% da população economicamente ativa (PEA), estimada em 110,7 milhões de pessoas pelo IBGE em fevereiro deste ano. O Ministério da Fazenda informa que a decisão de isentar rendas até R$ 5 mil reduzirá em cerca de 10 milhões o total de contribuintes em 2026, diminuindo assim a porcentagem de brasileiros que pagam o imposto.
Sobre a previsão para o número de declarantes em 2026 após essa mudança, o Ministério da Fazenda não forneceu estimativa detalhada, citando que esse valor depende também de outros fatores, como receita bruta de atividades rurais, patrimônio e rendimentos de aplicações financeiras.
Segundo a consultoria PwC Brasil, com base em dados de 2025, nos Estados Unidos cerca de 81% da força de trabalho contribui para o Imposto de Renda, totalizando 140,63 milhões de declarantes contra 174,2 milhões de trabalhadores. No Reino Unido, há 37,4 milhões de contribuintes individuais para uma força de trabalho de 35,4 milhões, indicando que praticamente toda a população economicamente ativa, mais outros grupos, paga IR. Na Alemanha, quase 100% da força de trabalho, ou seja, 43 milhões de declarantes em uma população ativa de 43,77 milhões de pessoas, contribui para o imposto.
A PwC ressalta que, embora a correlação exata entre declarantes e população ativa não seja perfeita, essas comparações evidenciam o distanciamento do Brasil em relação aos países desenvolvidos em termos de participação no pagamento do Imposto de Renda.
Posicionamento do governo e desafios na tributação
Para o Ministério da Fazenda, o Brasil apresenta uma elevada concentração de renda no topo da pirâmide, o que faz com que pequenas alterações na faixa de isenção tenham impacto considerável no número de contribuintes. A maior parte da população recebe rendimentos baixos e homogêneos, contrastando com um grupo menor, porém heterogêneo, de altos rendimentos.
Além disso, o alto índice de informalidade no mercado de trabalho dificulta o controle e a arrecadação do IRPF pelo governo. Apesar de medidas para aumentar a formalização, os efeitos são lentos.
Nesse contexto, comparações com nações desenvolvidas, que possuem rendas médias maiores e menor desigualdade, tornam-se inadequadas. Importante destacar que essa discrepância já existia antes mesmo da reforma do Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF), sendo que em 2023 a relação entre declarantes e população economicamente ativa estava abaixo de 40%.
Distribuição de renda e propostas para maior equidade
Economistas argumentam que o Brasil deveria seguir o exemplo de outros países que promovem melhor distribuição de renda por meio da taxação mais rigorosa sobre lucros e dividendos, o que poderia gerar um incremento superior a R$ 100 bilhões anuais em arrecadação.
Essa receita adicional poderia servir para reduzir impostos elevados sobre empresas, como o IRPJ e a CSLL, ou sobre o consumo, que atualmente pesam mais sobre a população de menor renda e dificultam a redução das desigualdades.
Na avaliação da PwC Brasil, a ampliação da faixa de isenção contribui para um sistema tributário mais progressivo e para a diminuição de desigualdades, mas o ideal seria que o país desenvolvesse uma melhor distribuição de renda e uma força de trabalho remunerada de maneira mais ajustada à realidade dos países desenvolvidos, aumentando o número de contribuintes da Receita Federal.
Já o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) destaca que, apesar da conquista da ampliação da faixa de isenção, os mais ricos ainda se beneficiam de diversas isenções e brechas fiscais, como a não tributação de lucros e dividendos, privilégios ao agronegócio e subtributação de grandes patrimônios. Enquanto isso, a maior parte da população arca com tributos sobre o consumo, que são regressivos e impactam severamente as famílias de baixa renda.
O projeto do governo Lula não incluiu aumento da tributação sobre lucros e dividendos nem redução do IRPJ, medidas que haviam sido propostas pelo governo anterior e chegaram a ser aprovadas pela Câmara em 2021, mas não avançaram no Senado.
O Ministério da Fazenda reconhece a necessidade de reformas mais amplas para tornar o IR mais progressivo, tributando proporcionalmente mais os mais ricos, porém entende que tais mudanças devem ser implementadas no início dos mandatos governamentais.



