Reforma Do IR Propõe Alíquota Igual Para Milionários E Classe Média

Reforma Do IR Propõe Alíquota Igual Para Milionários E Classe Média

Milionários e classe média pagam impostos semelhantes com proposta de Lula: avanço considerado insuficiente

A reforma do Imposto de Renda que está próxima da aprovação no Congresso prevê um aumento na tributação dos milionários, mas segundo dados oficiais analisados pelo Sindifisco Nacional, essa fatia da população manterá uma carga tributária próxima ou até inferior à da classe média. O levantamento indica que profissionais como professores, policiais militares e bombeiros policiais contribuem com mais de 10% de sua renda em Imposto de Renda, índice superior ao imposto mínimo de até 10% previsto para os milionários na nova proposta.

A alíquota efetiva, que representa o percentual da renda total dedicado ao IR, tende a ser menor entre os mais ricos, pois uma parte significativa da renda dessas pessoas, como os dividendos – lucros distribuídos a acionistas – é isenta de tributação desde 1996 no Brasil.

Inicialmente, o Ministério da Fazenda planejava uma reforma ampla do IR para corrigir essas distorções, mas, devido à dificuldade em aprovar medidas que afetassem diversos interesses, o governo Lula optou pelo imposto mínimo como forma de tributar parte da renda atualmente isenta de pessoas muito ricas.

Carolina Gonçalves, coordenadora de Justiça Social e Econômica da Oxfam Brasil, reconhece que o imposto mínimo de 10% representa um avanço para a justiça tributária, mas o considera insuficiente comparado aos padrões internacionais, destacando que apenas Brasil, Letônia e Estônia não tributam dividendos. Segundo ela, a maior parte dos super-ricos no país possui renda capitalista, predominantemente dividendos, o que os beneficia de uma tributação reduzida.

A proposta governamental prevê que a receita arrecadada com o imposto mínimo será usada para ampliar a faixa de isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil mensais e reduzir o tributo para aqueles que recebem até R$ 7.350. O projeto obteve aprovação unânime na Câmara e precisa ser votado no Senado até dezembro para valer em 2026, sendo visto pelo governo como uma estratégia para a campanha de reeleição de Lula.

O imposto mínimo terá alíquotas progressivas que variarão de 0% para quem ganha entre R$ 50 mil e R$ 100 mil por mês, até 10% para rendimentos superiores a R$ 100 mil mensais. O mecanismo calcula o quanto o contribuinte já pagou e, se a alíquota efetiva for inferior ao mínimo, cobra a diferença para atingir 10%.

De acordo com o Ministério da Fazenda, a reforma beneficiará 14 milhões de pessoas e arrecadará valores principalmente de aproximadamente 141 mil contribuintes de alta renda. O economista Sergio Gobetti aponta que o imposto mínimo impactará sobretudo milionários, pois quem recebe entre R$ 600 mil e R$ 1 milhão anuais já paga alíquotas médias superiores a 10%.

Porém, há exceções à tributação ampliada. Uma modificação no projeto protege grandes produtores rurais declarantes de IR na categoria pessoa física com lucro presumido, que continuarão a pagar imposto sobre 20% da receita, mantendo a maior parte da renda isenta mesmo com rendimentos anuais acima de R$ 600 mil.

Dados do Sindifisco apontam que produtores rurais pagaram uma alíquota efetiva média de 4,66% em 2023, com renda média anual de R$ 331,7 mil. Em contraste, professores do ensino fundamental declararam menos de um terço da renda dos produtores (R$ 104,7 mil) e pagaram alíquota efetiva ao redor de 9,76%.

Embora limitada, a reforma é vista por especialistas como um fator para reduzir a desigualdade de renda no país. O economista Branko Milanovic afirmou à BBC News Brasil que não há dúvida sobre o impacto da medida nesse sentido, embora haja críticas que alegam que ela possa causar fuga de capitais, argumento contestado pelos defensores da mudança e por dados da Receita que indicam queda no percentual de milionários deixando o Brasil anualmente.

Profissionais da classe média que pagam mais imposto que milionários

O Sindifisco analisou dados da Receita Federal referentes às declarações de IR de 2023 e descobriu que diversas ocupações com rendimentos intermediários têm alíquotas médias superiores a 10%, maior que a prevista para milionários com a nova reforma. Essas categorias não serão beneficiadas pela proposta e continuarão pagando taxas semelhantes ou mais elevadas que certos grupos ricos.

Professores do ensino médio tiveram renda média anual de R$ 121,7 mil (cerca de R$ 10 mil mensais), pagando 10,5% de IR em média. Outras profissões com rendimentos abaixo de R$ 160 mil anuais e alíquotas superiores a 10% incluem policiais militares (10,67%), bombeiros militares (12,16%), técnicos em metalmecânica (11,25%), geógrafos (10,97%) e bibliotecários (11,07%).

Além disso, bancários (9,16%), assistentes sociais (9,64%) e enfermeiros, nutricionistas e farmacêuticos com nível superior (9,88%) com rendimentos em torno de R$ 105 mil a R$ 112 mil anuais enfrentam alíquotas próximas de 10%.

Segundo o Sindifisco, a carga tributária sobre a classe média tem aumentado nas últimas duas décadas devido ao congelamento da tabela do Imposto de Renda, que não acompanha a inflação, enquanto milionários têm pago menos imposto em função do crescimento das rendas isentas, especialmente dividendos.

O estudo indica que, em 2023, contribuintes com renda entre 80 e 320 salários mínimos (de R$ 1,267 milhão a R$ 5,068 milhões anuais) pagaram alíquota efetiva média de 6,11%, enquanto os que ganham acima de 320 salários mínimos (acima de R$ 5,068 milhões anuais) pagaram em média 4,34%, menos da metade do imposto de quem recebe entre 5 e 30 salários mínimos por mês (alíquota média de 9,85%).

Historicamente, em 2007, a taxa efetiva de IR era mais equilibrada, com milionários pagando cerca de 6,9% e a classe média 6,3%.

Dão Real, presidente do Sindifisco, destaca que a reforma em pauta corrige parcialmente essas distorções, defendendo que as alíquotas sejam progressivas e que o imposto mínimo sobre os mais ricos chegue a até 15% para compensar a diminuição no tributo da classe média.

No entanto, o governo optou por uma alíquota máxima de 10% no imposto mínimo para evitar resistências políticas.

Por outro lado, a proposta vai conter o aumento do IR sobre contribuintes de renda mais baixa, provocado pelo congelamento da tabela. Atualmente, o grupo com renda até cinco salários mínimos paga uma alíquota efetiva média de 2,66%, bem maior do que 0,22% observados em 2007. A isenção planejada para ganhos até R$ 5 mil e a redução para até R$ 7.350 trarão alívio para essa parcela da população.

Por que os ricos passaram a pagar menos imposto que a classe média?

Nas últimas duas décadas, a parcela do IR paga efetivamente pelos mais ricos caiu quase 40%, fruto do aumento da participação da renda isenta na composição dos seus rendimentos, especialmente os dividendos, que cresceram 43% entre 2020 e 2023, acima da variação de 31% da renda total neste período.

Dão Real explica que o congelamento da tabela desde 2009, sem correção pela inflação, faz com que trabalhadores de renda baixa e média paguem progressivamente mais imposto à medida que seus salários são reajustados, elevando as alíquotas efetivas desses grupos.

Atualmente, o limite de isenção do IR é de R$ 2.259 mensais, e as alíquotas variam de 7,5% a 27,5% para quem ganha acima desse valor, sendo que a maior alíquota incide sobre rendimentos acima de R$ 4.664,68, o mesmo valor desde 2015.

Com o desconto simplificado instituído em 2023, a isenção efetiva já atinge quem ganha até dois salários mínimos (R$ 3.036). Enquanto isso, os rendimentos mais elevados deixam de aumentar sua alíquota efetiva por conta do crescimento das rendas que não são tributadas.

Dessa forma, apesar do aumento nominal do IR para as faixas baixas e médias, a carga tributária sobre os mais ricos tem diminuído devido à maior fatia da renda isenta em seus ganhos totais.

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