Tarifaço dos EUA: Brasil Enfrenta Nova Dinâmica Geopolítica e Econômica
O tarifaço imposto pelos Estados Unidos ao Brasil evidencia uma transformação na dinâmica das relações internacionais, em que a política assume papel prioritário sobre questões econômicas. Esta situação desafia o país a se adaptar a um ambiente de incertezas tarifárias e geopolíticas intensificadas.
Desde 9 de julho, o Brasil enfrenta uma sobretaxa de 50% sobre seus produtos aplicada pelos EUA. Embora tentativas de negociação com o então presidente Donald Trump tenham ocorrido, nenhuma solução foi alcançada. Em 31 de julho, Trump assinou uma ordem executiva justificando a tarifa como resposta a ações do governo brasileiro que representam ameaças à segurança nacional, política externa e economia americanas. O documento menciona decisões do Supremo Tribunal Federal, como os processos envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro e questões relacionadas às redes sociais norte-americanas, que afetaram a relação bilateral.
Apesar do anúncio, diversas exceções foram consideradas na tarifa, incluindo produtos-chave do comércio Brasil-EUA, como suco de laranja, aviões e petróleo, totalizando cerca de US$ 18,4 bilhões (R$ 102,49 bilhões), conforme dados da Amcham baseados na USITC de 2024. Essa lista trouxe algum alívio ao mercado, reduzindo a percepção de impacto severo e sugerindo uma possível abertura para negociações futuras.
No entanto, setores relevantes como café, frutas e carne ficaram fora das exceções, fortalecendo dúvidas sobre possíveis retaliações futuras e a escalada do conflito comercial entre os países.
Nova realidade geopolítica e impacto na economia
Solange Srour, diretora de macroeconomia para o Brasil no UBS Global Wealth Management, aponta que a prevalência do viés geopolítico sobre o econômico nas relações internacionais reflete uma tendência global da qual o Brasil não poderá escapar. “Vivemos num mundo de mais riscos”, afirma.
Segundo Srour, comercialmente, o pouco déficit brasileiro em relação aos EUA não justifica uma intensificação da guerra comercial. Porém, o ambiente político mais acirrado ainda pode gerar novas sanções.
Avaliação sobre o anúncio e negociações
Para a economista, o desfecho foi melhor do que previsto, já que metade das exportações brasileiras aos EUA estão na lista de isenções, o que diminui o impacto sobre o PIB, que já não seria expressivo, e não deve influenciar a inflação. A possibilidade de uma escalada comercial foi atenuada, embora as ameaças tarifárias não estejam completamente descartadas a longo prazo.
Sobre a atuação do governo brasileiro, Srour não identifica falhas, mas acredita que o país demorou a captar as mudanças globais, nas quais fatores diplomáticos interferem cada vez mais na economia. Ela defende que o Brasil deveria manter uma postura mais neutra para atrair investimentos e mercados, aproveitando-se deste cenário mundial dividido. Destaca, contudo, que empresas dos dois países conseguiram dialogar com a Casa Branca, evidenciando os prejuízos que a sobretaxa traria.
Projeções econômicas e desafios futuros
A diretora do UBS acredita que as projeções para a economia brasileira continuam estáveis, com crescimento moderado, mercado de trabalho resiliente e expectativa de avanço do PIB em torno de 2%. A inflação deverá ficar perto de 6%, melhor do que o previsto no início do ano, mesmo elevando a taxa de juros para 15%.
O ambiente fiscal incerto e o fortalecimento do câmbio prejudicam a queda da inflação, e a influência da geopolítica sobre a economia tende a aumentar mundialmente. A recuperação do equilíbrio fiscal, prevista para 2027 independente do vencedor das eleições presidenciais de 2026, será fundamental para manter o crescimento e atrair investimentos, especialmente se implementada uma reforma tributária.
Exceções tarifárias e negociações
Srour interpreta as exceções da lista dos EUA não como sinal de negociações concretas, mas reflexo da pressão de empresas americanas impactadas pelas tarifas, que atuaram para demonstrar a importância do mercado brasileiro. Sectores como aeronaves e suco de laranja, grandes exportadores brasileiros, seriam gravemente prejudicados com a sobretaxa, o que reforça estas exceções.
Assim, ainda não há avanços diplomáticos claros e futuros desdobramentos permanecem incertos.