Visa avança no mercado de stablecoins com desafio de não prejudicar suas próprias receitas
Ao longo das últimas décadas, a Visa consolidou-se como protagonista global em pagamentos, movimentando trilhões de dólares anualmente. Com o crescimento das stablecoins — criptomoedas atreladas a ativos estáveis, como o dólar — a empresa enfrenta um desafio significativo: integrar essas moedas digitais de modo a ampliar seus negócios sem comprometer suas receitas tradicionais.
Nos últimos anos, a equipe liderada por Cuy Sheffield, chefe de criptografia da Visa, intensificou suas operações relacionadas a stablecoins. A empresa firmou parcerias com bancos para emitir tokens próprios e estabeleceu acordos com fintechs globalmente para expandir sua atuação nesse setor emergente.
Embora a Visa ainda não tenha descartado a possibilidade de lançar sua própria stablecoin, ela tem trabalhado para usar a infraestrutura atual e atuar como ponte facilitadora entre stablecoins e a rede global de pagamentos tradicionais.
Sheffield ressalta que as stablecoins representam apenas uma forma adicional de realizar trocas de valores e acredita que esse mercado pode ampliar muito o alcance da Visa. Para ele, as stablecoins não são uma ameaça imediata, mas uma oportunidade para crescer.
Analistas destacam que, mesmo sendo os pagamentos via stablecoins teoricamente mais baratos comparados às tarifas tradicionais dos cartões, eles ainda necessitam de serviços essenciais como prevenção a fraudes, resolução de disputas, conformidade regulatória, interoperabilidade com sistemas bancários e conversão de moedas fiduciárias.
Segundo um estudo do banco Standard Chartered, o mercado de stablecoins, que cresceu 62% no último ano chegando perto de US$ 269 bilhões, pode alcançar US$ 2 trilhões em três anos. Apesar disso, as transações diárias via stablecoins somam cerca de US$ 30 bilhões, menos de 1% dos fluxos monetários globais.
Enquanto isso, a Visa mantém sua robustez financeira, com alta de 30% em suas ações no último ano e crescimento de 14% em receita, alcançando US$ 10,2 bilhões no terceiro trimestre.
No entanto, a expansão das stablecoins implica competição crescente, especialmente nos Estados Unidos, onde a legislação tende a facilitar sua adoção e onde players relevantes como PayPal e Stripe também atuam no segmento.
Embora a Visa possa desempenhar papel central na adoção inicial das stablecoins, no longo prazo, essas moedas podem permitir transações diretas entre usuários, o que pode ameaçar os modelos tradicionais de redes de cartões.
Um caminho para essa integração tem sido o projeto Visa Tokenized Asset, lançado em 2024, que permite que instituições financeiras emitam e gerenciem tokens digitais em redes blockchain. O banco espanhol BBVA, por exemplo, está usando essa plataforma para criar tokens na rede Ethereum, com projetos piloto previstos para este ano.
A Visa também tem expandido seus serviços de liquidação em stablecoins, possibilitando que clientes cumpram obrigações na VisaNet utilizando essas moedas digitais, inclusive operando sete dias por semana.
Além disso, a empresa realizou parcerias, como com a fintech Rain nos EUA, que emite cartões de crédito lastreados em stablecoins, evidenciando a abordagem agressiva da Visa em comparação a concorrentes mais cautelosos. No âmbito de mercados emergentes, a Visa fechou acordo com a Yellow Card, companhia que opera com stablecoins em diversos países africanos, buscando ampliar o uso dessas moedas digitais em gestão de tesouraria e transferências internacionais.
Com o cenário atual das stablecoins em ascensão, a Visa tenta equilibrar o avanço nessa nova tecnologia sem comprometer suas receitas tradicionais de processamento de pagamentos.